Adaptando outras histórias para GURPS

Transforme o mundo do anime, cinema, HQ, games, entre outros, em GURPS.

Autor: Dantas
E-mail: dantas5@gmail.com
Na net: www.projetogurps.com.br

01. Introdução: O porquê do artigo.
O mundo não é Érrepêgêocêntrico, ou seja, o mundo não gira em torno do RPG. Esta é a realidade. Nem tudo é RPG no mundo de um jogador, além do mais, encontramos por aí toneladas de (bons) HQs, mangas, filmes e histórias no geral. Isso é tão bom que nos dá aquela profunda vontade angustiante: "No filme, ele pula cinqüenta metros... Como seria no RPG?"
Transformar histórias em RPG é algo comum que, vira-e-mexe, surge em nossa mente. Uma picuinha freqüente que, talvez, comece com "quanto eu tenho de força?" e que vai até a literalmente secular procura por um suplemento específico de um anime super-famoso-que-só-você-é-fã e ninguém encontra informação nenhuma.
Já que não se encontra nenhuma adaptação para aquela história, que tal criar a adaptação você mesmo? As linhas seguintes tentam mostrar um caminho para que isso se dê.
Mãos à obra.

02. Quanto adaptar?
Antes de tudo, devemos deixar claro que há uma diferença entre "é... eu gosto um pouco" e "sou fissurado". Nem sempre se quer que a história a ser adaptada modifique profundamente o cenário de uma campanha já em desenvolvimento, além do mais, "em time que ganha, não se mexe". De qualquer modo, sugere-se que o mestre converse com os PCs sobre o nível desejável de adaptação, isso facilitará as coisas.

02.01 Peculiaridades
Um nome, um lugar, um rosto, apenas uma ilustração. Muitas vezes levamos, subconscientemente, para a aventura coisas de uma outra história, talvez sem querer, outras vezes só para descontrair, ou mesmo para ilustrar melhor uma cena aos PC's perdidos (ou ao mestre que nunca entende o que se deseja).
Talvez isto nem seja lá uma adaptação, pois é tão "pequena" que não carrega a simbologia da história principal, mas pode ajudar, e muito, a ilustrar o mundo e a envolver os PC's a ele.
Exemplo 1: Jean ValJean é o nome da personagem principal do romance Os Miseráveis, de Vitor Hugo, que se passa na França pós-revolução. Legal. Eu gostei do nome. O que impede a minha personagem de chamar-se Jean ValJean e ser um cavaleiro medieval num mundo de fantasia? Nada, e é isso que ele é.
Exemplo 2: Após uma enrascada, um personagem é detido e levado ao 25o. DP, onde o delegado o aguardava. Normal, até aí. Porém o mestre, para ilustrar o delegado de forma melhor, o faz fisicamente igual ao "Comissário Gordan" do Batman. Esse delegado será o Comissário Gordan? Agirá como ele? Terá ligação com o Batman? Não (mas pode ter, ver "Personagens - NPC"). Neste nível de adaptação, o fato de parecer com o Comissário Gordan se dá apenas para auxiliar a descrição e nada mais. Pode ser, até, que seja apenas o personagem em questão que acredite que o delegado pareça com Gordon, além do mais, antes de ser preso, ele tinha acabado de assistir ao "Batman Bigings"... Vai saber...

02.02 Especificidades
Este caso de adaptação é um pouco mais complexo, pois vai além de um simples nome ou aparência para tocar, muitas vezes a fundo, uma parte da história. A especificidade é um ponto verossímil da história original que será usado na aventura. Uma arma, uma magia, um golpe de judô, um tipo de carro-bem-louco. Aqui começamos a adaptação propriamente dita, que sai do campo das idéias e entra para efeito de jogo.
De muitos lugares tiramos nossas idéias para aventuras, porém algumas coisas acreditamos tão bem-boladas que vale a pena transformá-las e inseri-las integralmente.
Exemplo máximo: "As armas da Caverna do Dragão". Logo quando comecei a procurar material de GURPS na net, encontrei as famosas "Armas da Caverna do Dragão" adaptadas, por um desconhecido, para GURPS. Creio que todos já viram isso. Este é o exemplo máximo: não se quer os personagens, não se quer o cenário, não se quer nome e coisas assim; neste caso, só as armas que importam e só estas estarão na aventura. Seus efeitos foram "GURPados" (adaptados para GURPS) e o jogo continua. Elas entram como armas encantadas com as magias tal-tal e podem ser o objetivo da busca à uma caverna ou ser as próprias armas dos PCs (ou de um vilão...).
Esse tipo de adaptação é completamente estimulado em GURPS, uma vez que este sistema, em seus livros oficiais, mostra como criar novos elementos que, "com o acordo do GM", podem integrar a aventura. Uma nova magia, perícia, super-vantagem, raça, item, etc-etc-etc. Em GURPS, existem meios para criá-los; com as adaptação, basta apenas GURPá-los.

02.03 Personagens - NPCs
Adaptar personagens de uma história é um outro nível, bem diferente da adaptação de uma simples perícia, além do mais, aqui, começa a, realmente, ser necessário um certo conhecimento por parte do mestre de o que será adaptado. Ainda mais no quesito personagens que, além de adaptar possíveis regras da história (como um golpe especial que só ele sabe fazer), requer interpretação do mestre. "Como o Blade agiria se perguntassem...?"
Esta é a inserção de um "elemento vivo", retirado de outro local, a um cenário já criado.
Exemplo: No cenário de um super-herói qualquer, a saber, Super Choque, com sua cidade, seus problemas, suas histórias, entra, para ajudá-lo a combater o Coringa e sua gangue, a Liga da Justiça. O que acontecerá? O Super-Choque terá de interagir com NPC's de grande porte como a Liga da Justiça (e até mesmo o Coringa) e, por alguns capítulos, personagens prontos e fixos de outras histórias serão "adaptados" ao universo de Super-Choque e os meta-humanos.
Os personagens grandes podem ser utilizados como estímulos a personagens pouco experientes "um dia serei como ele", ou para qualquer outro fim que seja "eu sempre quis lutar ao lado da mulher maravilha". De qualquer forma, haverá um propósito para a aparição destes personagens na aventura. Quem sabe não serão os próprios PCs que irão buscá-los "Vou atrás de Pay-Mey para ser treinado".

02.04 Cenário
A próxima expansão rumo ao "conhecimento absoluto" (será mostrado abaixo) é o uso do cenário da história para ser nele que se passam as aventuras dos PCs. Não se quer personagens prontos, não se quer intrigas intergalácticas, apenas o mundo, com algumas problemáticas já criadas. Quanto maior o uso da história a ser adaptada na aventura, maior deve ser o conhecimento do mestre sobre ela, além do mais, o GM deve saber o que está fazendo!
Este tipo de adaptação é o que ocorre com maior freqüência e que inspira o maior número de livros de GURPS. Quem nunca quis jogar no Japão dos Shogunatos? Pois bem, o livro de adaptação chama-se GURPS Japan e conta com regras e discrição de tal cenário. Simples, não? GURPS China, GURPS Egito, GURPS Atlantis, GURPS Fantasy, principalmente GURPS Fantasy, além do mais, muitas vezes, só pegamos o cenário do jogo para dar asas a nossa liberdade e inventar a história que queremos. A Terra e sua rica história é, com certeza, neste ponto, a mais adaptada/adaptável/que-já-foi-adaptada/que-falta-adaptar.

02.05 Cenário e personagens
Talvez seja neste ponto que entramos, realmente, onde todos queriam chegar. A adaptação do cenário E das personagens da história em questão, ou seja, além de jogar no mundo de Samuray X, jogaremos, também, com as personagens deste anime. Um dos pré-requisitos para esta adaptação é um considerável "nível de fã" por parte do mestre e de alguns dos jogadores.
Neste caso, o cenário é o mesmo da história a ser adaptada, porém os jogadores não serão os verdadeiros protagonistas, por exemplo, no cenário de Smallville, nenhum dos PC's será o Super Homem, mas poderão, sim, encontrar com ele. O mestre precisa ser duplamente perspicaz, pois inserirá os PCs no cenário da série e terá de representar os personagens de série, sem contar as adaptações dos super-poderes que alguns deles podem apresentar.

02.06 Cenário e personagens: o conhecimento absoluto
Este é uma variação do item acima. Além dos PCs estarem no cenário da história, eles SERÃO os verdadeiros protagonistas da história.
Exemplo: No universo dos Cavaleiros do Zodíaco, o grupo de PCs será os cinco principais cavaleiros de bronze que jogarão as mesmas ou outras sagas, definidas pelo mestre. Neste caso a adaptação é absoluta, os PCs estarão no centro literal da história adaptada ao RPG. Por essas e outras, é daqui que saem, muitas vezes, sistemas independentes de RPG: o nível que se requer da adaptação é tão alto que é mais fácil começar com um sistema próprio.
Vira-e-mexe, encontramos as fichas de alguns grandes personagens prontos, como o caso dos personagens do Mundo Marvel e de outras adaptações que saem em revistas especializadas, por exemplo. Isto facilita a vida do mestre e dos jogadores, uma vez que minimiza o trabalho de todos, porém nem sempre é assim. A maioria das vezes o grupo deve correr atrás, ou, mesmo, fazer, ele próprio, as adaptações necessárias ao jogo.

03. Modificações no sistema
É perceptível que, muitas vezes, ao tentar adaptar algo à GURPS, são necessárias algumas mudanças no próprio GURPS, seja adicionando novos poderes/perícias/incrementos/limitações, ou, mesmo, caso não exista outra saída, criando apêndices inteiros de novidades. Isto é comum e, deste modo, muitas novas regras são criadas e, após alguns testes, oficializadas em GURPS.
A disposição de um mestre para criar um sistema de adaptação perfeita é o que varia. Alguém que, realmente, quiser montar uma nova adaptação completa e de conhecimento absoluto (ver acima) envolvendo até as peculiaridades-que-apenas-os-muito-fãs-conseguem-perceber, talvez precise, até, de um sistema de regras próprio: tudo em favor da adaptação. Porém este não é o desejo de todas as pessoas, logo, de modo mais moderado, podem-se fazer algumas modificações que requerem alguma experiência e estudo, mas que aproxima, e muito, o GURPS da história adaptada.
Exemplo 1: Em Pokémon, Ash convoca Pikachú. Isso é uma perícia? É uma magia? É teste de ST? Vamos dizer que é um simples teste de Armas Arremessáveis (Pokébola) F/F. Sai o Pikachú e ataca com uma voadora-de-dois-pés. Isso é uma magia? Uma Arte marcial? Quem testa é o Pikachú (ou seja, o próprio mestre, por ser um NPC) ou o Ash? Vamos dizer que a voadora é um teste simples de DX feito pelo animal que recebe +1 devido ao "Aptidão para Treino de Pokemons" que o Ash possui.
Aptidão para Treino de Pokemons? O que é isto? Esta é uma nova vantagem que acresce +1, por nível, a qualquer ataque que o Pokemon convocado dê. Ela custa 10 pontos por nível ao Ash.
É na modificação do sistema que são definidas bases de regras importantes, e essenciais, para a adaptação. Perícia ou vantagem? Tudo deve ser definido. É, justamente, esta definição em massa que afasta uma mente criadora do ato efetivo de adaptar: "dá tanto trabalho", porém o que não se sabe é que o trabalho é relativo ao ponto de adaptação em que se está disposto a chegar, a quanto de realidade se quer dar à aventura, quão verossímil será a adaptação da história original.
Exemplo 2: E SE, ao invés de "DX + nível de aptidão para treino de pokemon", o mestre simplesmente substitua esse teste por um NH12? É uma possibilidade. De onde veio esse 12? Ele saiu da mente do mestre que, ao invés de se apegar à picuinhas de bônus e redutores, desejou uma aventura que flua melhor e mais rápido. Simples assim.

04. Modificações na história
Este é um exemplo de adaptações na própria adaptação: além de transferirmos os Power Rangers ao sistema de RPG que usamos, podemos arrastá-los para um novo estilo, dando asas à nossa imaginação. Usam-se elementos de uma história, porém o gênero é substituído e nesta substituição é que se pode criar uma infinidade de novos jogos. É nesta hora que adicionamos toda a flexibilidade do RPG às possibilidades da história original: os resultados serão impressionantes.
Do mesmo modo que é possível uma aventura de ação com Power Rangers, é possível que, jogando com eles, consigamos boas risadas, em uma aventura de humor, ou bons sustos, no caso do horror. E porque não transportá-los ao incrível mundo dos illuminatis? E quem é que disse que eles já não estão nele? FNORD.

05. O Não-Exemplo
O mundo das adaptações, apesar de garantir boas aventuras, é um tanto complexo e requer, acima de tudo, um mestre preparado para conduzir bem o jogo entre os caminhos de quanto de adaptação se escolheu usar. Geralmente, não se tem bons resultados quando, mestrando de improviso, resolve-se roubar completamente um universo e as aventuras de um jogo de computador para entreter os jogadores.
Exemplo: Zelda é um jogo e tanto, porém, sem avisar aos jogadores, colocá-los, literalmente, no Templo do Fogo e falar "se vira aí", talvez não seja a melhor coisa a se fazer, além do mais, além de altas chances dos jogadores já conhecerem os caminhos para resolver os mesmos enigmas das mesmas salas, temos o desgaste dos jogadores perante a um mestre que apenas "copia e cola".
Pode-se usar o universo de Zelda, pode-se colocar os jogadores no Templo do Fogo, mas não será o "copiar e colar" que garantirá uma boa partida, mestre e jogadores devem fazer mais que isto: eles devem trabalhar a história original e, de um modo característico, alcançar um jogo satisfatório, construtivo e desafiador.

06. Conclusão
Não está nem nos horizontes distantes uma cartilha mágica que ensine a fórmula matemática correta para adaptar ao RPG as diversas histórias que gostamos, porém se podem mostrar os diversos caminhos que escolhemos percorrer para chegarmos ao universo das adaptações e abrir nossas possibilidades. Este artigo pretende ser o incentivo para que, seja quanto for, o mundo de boas idéias dos filmes, HQs, mangás, livros, contos-que-minha-vó-contava invada o seu RPG enriquecendo-o em seus elementos.

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